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A política externa brasileira

09-02-2011 08:50

A política externa brasileira

 

A primeira experiência de política externa ocorre com a transferência da monarquia portuguesa para a colônia.

No Brasil Império, o país se inseria na divisão internacional do trabalho como nação com vocação agrícola para a monocultura de exportação

No início da República, principia-se o panamericanismo. A negociação do funding loan em 1898 por Campos Sales e os problemas da promoção comercial e propaganda do café foram os grandes assuntos da diplomacia comercial do Brasil no início da república.

Entre 1902 e 1912 os problemas relevantes estão relacionados com os limites territoriais advindos com o fim do Tratado de Madrid. Outra questão é o equilíbrio do Cone-sul. Na vertente econômica destacam-se os empréstimos para estocagem de café e a criação da Caixa de Conversão.

Entre 1912 e 1930, a República dos Bacharéis, ocorre a tentativa de inserir o país no concerto de nações com o envolvimento na primeira grande guerra.

No período entre 1930 e 1945, o Brasil formula uma política externa própria, com o objetivo de aprofundar o desenvolvimento. Elementos de destaque no contexto externo são constituídos pela crise econômica inaugurada pelo crack da bolsa de Nova York, em 1929, e, sobretudo, pela política de alianças e de equilíbrio pendular entre imperialismos rivais, entre os quais se destacam os Estados Unidos e a Alemanha nazista.

No final do período, o Brasil define-se pela política de "grande aliança atlântica", confirmada pela participação na Segunda Guerra Mundial e pelo alinhamento com as posições norte-americanas.

Em todo caso, grande parte das energias da diplomacia do governo Vargas, no capítulo das relações econômicas externas, será mobilizada em função da necessidade de se lograr recursos financeiros e materiais para a instalação de uma usina siderúrgica no País, o que será alcançado mediante o apoio dos Estados Unidos à construção de Volta Redonda.

De 1945 a 1960, o mundo é enquadrada pela luta entre os modelos rivais do liberalismo e do socialismo. Se, por um lado, a doutrina da "segurança nacional" define o sustentáculo ideológico da Guerra Fria, o Pan-americanismo, por outro, mobiliza os esforços da diplomacia para a "exploração" da carta da cooperação com a principal potência hemisférica e ocidental. É nesse quadro de barganhas políticas e de interesse econômico bem direcionado que o Brasil empreenderá sua primeira iniciativa multilateral digna de registro, a Operação Pan-Americana, proposta pelo Governo Kubitschek em 1958.

No plano econômico externo, é nessa fase que tem início a negociação dos primeiros acordos de produtos de base – café, cacau, açúcar, entre outros -, com a criação concomitante das organizações multilaterais setoriais que se ocupam desses produtos. o Brasil renegocia sua adesão ao GATT, em 1957, a partir da nova Lei Aduaneira e de reclassificação tarifária.

A política regional é marcada por uma certa ambigüidade entre o equilíbrio estratégico e o isolamento diplomático, visível sobretudo no relacionamento com o principal parceiro e rival, a Argentina, mas o quadro evolui, sobretudo a partir da era Kubitschek, para a superação da competição e sua substituição pela convivência e pela cooperação. Começa a ter voga, nessa época, sob a impulsão do economista argentino Raul

Prebisch, o chamado "modelo cepalino", isto é, a promoção do desenvolvimento nacional por meio de políticas ativas de industrialização, eventualmente mediante a cooperação econômica no contexto sul-americano e a promoção de esquemas de integração. Tais esforços, inclusive por um certo mimetismo em relação ao mercado comum europeu recentemente (1957) instituído, resultarão, em 1960, na criação da Associação Latino-Americana de Livre-Comércio (ALALC). No plano institucional interno, é também nessa

fase que se completa a profissionalização da carreira diplomática, cujo acesso passa a se dar, desde 1946, por vestibular organizado pelo Instituto Rio Branco.

A política externa independente, 1961 a 1964, em sua primeira modalidade nos conturbados anos Jânio Quadros - João Goulart, representa uma espécie de parênteses inovador num continuum diplomático dominado pelo conflito Leste-Oeste. O impacto da revolução cubana e o processo de descolonização tinham trazido o neutralismo e o nãoalinhamento ao primeiro plano do cenário internacional, ao lado da competição cada vez mais acirrada entre as duas superpotências pela preeminência tecnológica e pela influência

política junto às jovens nações independentes. Não surpreende, assim, que a diplomacia brasileira comece a repensar seus fundamentos e a revisar suas linhas de atuação, em especial no que se refere ao tradicional apoio emprestado ao colonialismo português na África e a recusa do relacionamento econômico-comercial com os países socialistas. A aliança preferencial com os Estados Unidos é pensada mais em termos de vantagens econômicas a serem barganhadas do que em função do xadrez geopolítico da Guerra Fria.

Formuladores protagônicos dessa nova maneira de pensar foram políticos relativamente tradicionais como Afonso Arinos e San Tiago Dantas e alguns diplomatas de espírito inovador como Araújo Castro.

É nesse período que, ao lado da tradicional dicotomia Leste-Oeste, se começa a proclamar uma divisão do mundo ainda mais insidiosa, Norte-Sul, entre países avançados e países subdesenvolvidos. O Brasil foi um dos articuladores mais ativos das propostas desenvolvimentistas que resultaram na criação, em março de 1964, da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), cujos objetivos eram, nada mais, nada menos, do que a revisão completa da arquitetura do sistema multilateral de comércio e a criação de mecanismos — sustentação de produtos de base, sistema geral de preferências comerciais em favor dos exportadores de matérias-primas, não reciprocidade nas relações de comércio — suscetíveis de promover uma inserção mais ativa dos países em desenvolvimento na economia mundial. Quando a primeira sessão da conferência se realizava, em Genebra, o golpe militar no Brasil sinalizou, entretanto, um retorno a padrões mais tradicionais de política externa.

O período compreendido entre 1964 e 1967 foi de reenquadramento do Brasil no "conflito ideológico global" e representou mais uma espécie de "pedágio" a pagar pelo apoio dado pelos Estados Unidos no momento do golpe militar contra o regime populista do que propriamente uma operação de reconversão ideológica da diplomacia brasileira. Em todo caso, observa-se um curto período de "alinhamento político", durante o qual a nova "diplomacia do marechal" Castelo Branco —em contraposição àquela resolutamente nacionalista aplicada por Floriano Peixoto durante a revolta da Armada — adere estritamente aos cânones oficiais do Pan-americanismo, tal como definidos em Washington: registre-se, numa seqüência de poucos meses, a ruptura de relações diplomáticas com Cuba e com a maior parte dos países socialistas, assim como a participação de força de intervenção na crise da República Dominicana. A política multilateral e as relações bilaterais, de modo geral, passam por uma "reversão de expectativas", para grande frustração de parte da nova geração de diplomatas que tinha sido educada nos anos da política externa independente.

No plano econômico externo, a volta à ortodoxia na gestão da política econômica permite um tratamento mais benigno da questão da dívida externa, seja no plano bilateral, seja nos foros multilaterais do Clube de Paris ou nas instituições financeiras internacionais, como o FMI. É sintomático aliás que a única assembléia conjunta das organizações de Bretton Woods a realizar-se no Brasil, tenha tido por cenário o Rio de Janeiro da primeira era militar, em 1967, quando também se negocia a instituição de uma nova liquidez para o sistema financeiro internacional, o Direito Especial de Saque do FMI.

Entre 1967 e 1985 ocorreu a revisão ideológica e a busca de autonomia tecnológicaMas, a postura de princípio favorável a uma política exterior de tipo "tradicional" ou a aceitação indiscutida de regras diplomáticas caracterizadas pelo "alinhamento incondicional" às teses do principal parceiro ocidental vinham tendo cada vez menos vigência no Brasil contemporâneo, mesmo no regime dos militares adeptos da doutrina da segurança nacional. Basicamente, essas atitudes apenas se manifestaram nos primeiros anos do pós-guerra e no seguimento imediato do movimento militar de 1964, para serem logo em seguida substituídas por atitudes mais pragmáticas. A atitude "contemplativa" em relação aos EUA — partilhada igualmente pelos militares e pelas elites, de modo geral, durante a Guerra Fria — cede progressivamente lugar a uma diplomacia altamente profissionalizada, preocupada com a adaptação dos instrumentos de ação a um mundo em rápida mutação, e instrumentalizada essencialmente para o atingimento dos objetivos nacionais do desenvolvimento econômico.

Tem início, então, a participação plena do Brasil nos esforços de construção de uma "nova ordem econômica internacional", com atuação destacada em todos os foros multilaterais abertos ao engenho e arte de uma diplomacia mais madura e liberta das alianças exclusivas da Guerra Fria. O período pode ser caricaturalmente identificado com a "diplomacia dos rótulos", que efetivamente se sucedem entre 1967 e 1985, a saber:

     

  1. "diplomacia da prosperidade" ainda no Governo Costa e Silva;
  2.  

     

  3. "Brasil Grande Potência", no período Médici;
  4.  

     

  5. "pragmatismo responsável", sob a presidência Geisel;
  6.  

     

  7. "diplomacia ecumênica", já no último governo militar desse ciclo, o de Figueiredo.
  8.  

A despeito dessas classificações mais ou menos arbitrárias, tratou-se, basicamente, de uma "diplomacia do crescimento", consubstanciada na busca da autonomia tecnológica, inclusive a nuclear, com uma afirmação marcada da ação do Estado nos planos interno e externo. Mas, observa-se também nesse período a confirmação da fragilidade econômica do País, ao não terem sido eliminados os constrangimentos de balança de pagamentos que marcaram historicamente o processo de desenvolvimento brasileiro: as crises do petróleo, em 1973 e 1979, seguida pela da dívida externa, em 1982, marcam o começo do declínio do regime militar.

No período entre 1985 e 2000 temos a redefinição das prioridades e afirmação da vocação regional.

Os elementos mais significativos da postura internacional do Brasil poderiam ser atualmente caracterizados pelos seguintes processos: redefinição das prioridades externas, com afirmação da vocação regional, processo de integração subregional no Mercosul e de construção de um espaço econômico na América do Sul, opção por uma maior inserção internacional e aceitação consciente da interdependência — em contraste com a experiência anterior de busca da autonomia nacional —, com a continuidade da abertura econômica e da liberalização comercial, no quadro de processos de reconversão e de adaptação aos desafios da globalização. A diplomacia passa a apresentar múltiplas facetas, que não exclusivamente a de tipo bilateral ou aquelas de ordem estritamente profissional corporativa: são elas a regional, a multilateral (principalmente no âmbito da

OMC) e a presidencial.

As mudanças de ordem política, econômica e diplomática nas relações internacionais do País, neste período recente, são tão variadas, e de tal magnitude — tanto as surgidas internamente como as induzidas de fora —, que qualquer tentativa de levantamento das "questões relevantes" nesta fase da história nacional correria o risco de deixar de fora problemas importantes de uma agenda externa crescentemente diversificada e extremamente complexa, seja no âmbito multilateral ou nos diversos planos bilaterais.

Mencione-se, por obrigatória, a questão nem sempre bem colocada da "opção" entre uma "política externa tradicional" — por definição "alinhada" — e uma "política externa independente", problema dramatizado por anos de enfrentamento bipolar no cenário geopolítico global. Superando, contudo, o invólucro "ideológico" da postura externa do País nesse período, e mesmo os diversos "rótulos" com os quais se procurou classificar a diplomacia da era "militar", assume importância primordial, independentemente da postura política particular de cada Governo frente aos desafios do cenário internacional, a questão do desenvolvimento econômico, verdadeiro leit motiv da diplomacia brasileira contemporânea.

A política externa brasileira, desde os anos 50 pelo menos, foi basicamente uma política econômica externa, mesmo se problemas de ordem regional (rivalidade com a Argentina), de tipo político-ideológico (desafio insurrecional segundo o modelo "castrista") ou de cunho social-humanista (direitos humanos, por exemplo) ocuparam frações significativas da agenda diplomática em momentos determinados desse período. Sem

praticamente nenhum tipo de exceção, todas as grandes questões de política interna do País— industrialização, capital estrangeiro, política energética e de "segurança nacional" (começando pelo petróleo, passando pelo programa nuclear e chegando à política de informática), modernização tecnológica etc. — são também, e antes de mais nada, questões de política externa da Nação.

São essas as questões — acrescidas de algumas outras que delas derivam: dívida externa, meio ambiente, exportações de artigos militares etc. — que estão no centro das relações internacionais do Brasil Contemporâneo e que, como tais, devem conformar o próprio "menu" de um estudo global das relações internacionais do País. Uma outra questão, mais recente, mas que faz parte igualmente da agenda econômica "externa" da Nação, veio a elas se juntar em forma permanente: a política de integração regional, em especial o processo de constituição de um mercado comum no cone sul americano.

Ainda que esta última issue diplomática tenha resultado, basicamente, de uma opção de public policy cuja natureza foi fundamentalmente política — e mesmo "geopolítica", no bom sentido da palavra —, isto é, a decisão tomada, ao concluir-se o período militar, de encerrar a tradicional postura de conflito e de concorrência com a Argentina para substituí-la por uma de cooperação e de integração, essa questão representa, igualmente, um capítulo específico, ainda que inédito, da densa agenda brasileira no campo das relações econômicas internacionais. Ela é uma vertente, provavelmente a mais importante na atualidade, da já chamada "diplomacia do desenvolvimento".

Assim como a industrialização e a modernização econômica do País foram perseguidas de maneira persistente, desde longas décadas, pela sociedade em seu conjunto, a integração regional passa a fazer parte do horizonte histórico futuro da nacionalidade.

Num mundo em rápida mutação, com cenários geopolíticos e geoeconômicos ainda não totalmente claros, a opção de política regional adotada pelo Brasil passa a conformar um dos pontos mais importantes de sua agenda internacional. Como tal, essa questão deve figurar em posição de destaque em qualquer estudo que se empreenda, doravante, sobre as relações internacionais do Brasil. Nova fase de inserção econômica internacional, com a redefinição de algumas linhas de sua política externa (integração subregional), se define no bojo da terceira fase da globalização capitalista, que corresponde igualmente a um processo de grandes transformações na economia e na sociedade brasileiras.

Finalmente, nenhum estudo das relações internacionais do Brasil poderia descurar a perspectiva propriamente globalizante — e "primariamente" comparatista — consistindo em pensar sua inserção num sistema internacional cujas bases de funcionamento estão em processo de transformação acelerada. Não está ainda totalmente claro que estrutura de tomada de decisões políticas, em nível mundial, e que conformação precisa, em termos de sistema hierarquizado (ainda que segundo novos princípios), terá a ordem emergente atualmente, que passa a substituir o cenário bipolarizado enterrado ao mesmo tempo em que se cobre de terra o caixão do socialismo mundial.

Em todo caso, essa "nova ordem" já não mais consistirá, apenas, de duas superpotências, algumas potências médias e vários Estados "emergentes". Os fenômenos de "globalização" — não apenas restrito à internacionalização dos circuitos produtivos — e de "regionalização" — com a formação de blocos econômicos e políticos em diversas regiões do planeta — prometem introduzir novas variantes nos modelos até aqui conhecidos de sistema internacional, tais como referidos anteriormente: o modelo dos impérios universais, o das cidades-Estado comerciais e o moderno sistema de Estados. O cenário histórico futuro indica, previsivelmente, que o estudo das relações internacionais de um País como o Brasil terá de trabalhar, durante um certo tempo ainda, com os conceitos de "Estado periférico" e de "potência média". Ainda assim, o padrão de relacionamento de um Estado desse tipo com os atores principais do sistema internacional, bem como o peso específico de nações "periféricas" na estrutura do poder mundial sofrerão mudanças significativas em direção do horizonte 2000. Nesse sentido, uma reflexão comparada sobre as tendências de

desenvolvimento dos Estados médios, com base nos elementos de análise já disponíveis, poderá contribuir a uma melhor compreensão da agenda diplomática de um país-continente como o Brasil.

 

Referência:

ALMEIDA, Paulo Roberto de. Relações Internacionais e política externa do Brasil: uma perspectiva histórica. ISBN: 84-95950-67-7; pp. 255-269.

 

 


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